Lisboa, dia 24 de Setembro, 2009
" A beleza dos dias simples"
Ser percebida como uma "estrela", uma artista que se aprecia e até cobiça faz parte do meu dia-a-dia egípcio. Ter de andar sempre impecavelmente maquilhada, penteada e vestida. O peso da imagem e das expectativas que se têm de mim fora e dentro do palco. O poder das aparências tão íntimo do "show business" e tão distante de mim, enquanto pessoa.
Depois de cada espectáculo, refugio-me ao lado de quem amo. As luzes da ribalta interessam-me no palco, não fora dele.
Depois de cada espectáculo e quando posso descansar, procuro os cavalos árabes com os quais cavalgo no deserto, os amigos que o sabem ser e me querem além das aparências, os livros e a água. Preciso do escuro para me poder expôr à mais brilhante - e , frequentemente, ofuscante - luz.
Diariamente coberta de uma camada de céu que me confere o estatuto mas também me traz o peso de não poder ser simples. A patroa, a responsável, a criativa e o cérebro das operações. O talento e a corda diária ao redor do pescoço.
A paixão manifestada, as palmas sentidas e o reconhecimento do público são um estranho amor do qual me alimento (não o único porque de muitos amores se compõe a minha vida ) mas com ele vem a pressão (que, mais do que ninguém, coloco em cima de mim mesma) de ter se estar sempre acima do que se espera de mim. Noites sem dormir pensando no espectáculo que se segue. Insónias que me despertam a meio da noite para fixar novos movimentos que um sonho incómodo me trouxe, o constante despertar dos sentidos e um estado de alerta ininterrupto do qual raramente me desligo (apanágio de quem vive para a Arte e da Arte)...
Tento não me queixar. Metade de mim escolheu este caminho e não poderia ser feliz sem ser assim, selvagem e permanentemente criativa, demasiadamente acordada para a vida!
Esta passagem - hibernação! - por Portugal foi uma pausa urgente para respirar fundo.
Ainda estou a inspirar...feliz.
Uma das minhas melhores amigas - e talvez a pessoa que melhor me conhece - ofereceu-me um quadro com uma gravura que ela própria pintou representando-me a mim num traje de dança envolta no poder simbólico de um búzio. A gravura está cheia de ternura, amor por mim, admiração e respeito profundo de mulher para mulher.De amiga para amiga.De irmã para irmã.
Fiquei perplexa fixando a gravura enquanto me lembrava da sorte que tenho com as pessoas que me rodeiam.
Uma amiga que me pinta num quadro representando-me como uma deusa de rabiosque demasiado alçado, outra que cozinha para mim, um namorado/amante que canta/dança/cozinha/ escreve para mim, alunos que me oferecem as mais belas prendas da alma sem nada pedir em troca, público muito pouco anónimo que me abraça com alma e me agradece por lhes ter chegado à alma... Não há festa VIP ou louvores vazios que cheguem aos pés disto!
O poder das coisas simples. Impressionante!
Nada do que o sucesso e o "estrelato" traz faz parte do espólio dos mais divinos presentes. Quando se fala em pura FELICIDADE e PAZ, os tesouros simples são os que nos preenchem.
Eu sou rica.Muito rica...
Dou graças a Deus, eu que nem sou religiosa!
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