Sunday, April 3, 2011



Cairo, dia 3 de Abril, 2011


Conversa típica entre bailarina e empresário no Cairo.




Tudo se inicia, sem sobressaltos mas com a imprevisibilidade costumeira, com uma proposta de trabalho, um novo espectáculo, contrato, projecto relacionado com a Danca Oriental.





Aqui vai a típica conversa que eu já tive com milhentos personagens. Segue, invariavelmente, desta forma:


"-Salam ualeekum...

-Aleekum salam.

-Ouvi falar muito bem do seu nome. Dizem que é a melhor bailarina do Egipto.

- Muito obrigada. Vou fazendo o melhor que posso e sei.

- E vejo que é modesta, sim senhora. Mas o que eu oico dizer é outra coisa. A Joana é uma estrela!

- Com todo o respeito pelo seu elogio mas tenho a certeza que as estrelas estao no céu. Eu sou apenas uma artista fazendo o meu trabalho.

- Hhmmmmm.... (olhar no vazio, como que magicando algo indizível ou tentando entender a "complexidade" do que eu acabara de dizer).

* Silencio prolongado de ambas as partes, apenas quebrado por sorrisinhos lascivos do empresário e mirada perdida num horizonte de fantasias e planos que eu já consigo antever.



- Bem, vamos directos ao assunto. Do que se trata o trabalho que me quer propor? Sabe que eu tenho toda a estrututa do meu espectáculo montada. Orquestra, programa, técnicos, assistente. Estamos prontos para actuar esta noite, se for necessário.


- A Joana é casada? Tem namorado? Nao gosta dos homens egípcios, é? Olhe que aqui há homens de garra.


- Desculpe mas nao vejo o que isso pode interessar para o nosso acordo de trabalho. Se nao se importa, definimos aquilo que precisa de mim para o espectáculo.


- Voces, os estrangeiros (risada suave e irónica)...sempre com pressa para fazer tudo. Relax...

Nao temos pressa, na verdade. Eu pensei que poderíamos conhecer-nos melhor primeiro, uma vez que vamos trabalhar juntos.

Que tal se nos encontrássemos esta noite para jantarmos juntos e falarmos?"


E pronto. É precisamente AQUI que o molho entorna cá para o meu lado.

Eu torco o nariz, digo que ja estamos a conversar e nao será preciso jantarmos para nos conhecermos melhor.


Ele ignora, redonda e claramente, este meu comentário como se eu lhe estivesse a ditar uma receita complicada de bolo de chocolate que a minha avó costumava fazer lá em casa.

Eu adiciono que fico a espera dos detalhes para o trabalho e ele adiciona, com uma amabilidade angelical que espera o meu telefonema para jantarmos juntos.


A partir deste momento, sei que se seguem os telefonemas a altas horas da noite para encontros "casuais" num hotel, restaurante, "night-club" a fim de discutirmos os "detalhes" do trabalho e sei que eu, devido a experiencia que já acumulei nestes cambalachos egipcios, vou desligar-me completamente do assunto e seguir adiante, esperancosa que uma ou outra excepcao fuja a regra do sistema sujo da Sagrada Danca Oriental no Egipto!


Santa inocencia que (ainda) carrego em mim...Oh, Lord!

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