Sunday, May 11, 2014

O rato que roeu a rolha do rei da Rússia (tudo em aberto)

Num restaurante do Cazaquistão* - Astrakhan, Russia
 
Viajar pelo mundo em trabalho é, para mim, um dos maiores privilégios da minha carreira/profissão. É claro que não basta ir e vir; não basta ver paisagens novas e entrar em contacto com outras culturas: é preciso VER, QUESTIONAR, colocarmo-nos nos sapatos do OUTRO para que a sua vida (e circunstâncias que poderiam ser as nossas) nos possa ensinar alguma coisa.
A Rússia, mais do que qualquer outro país onde já ensinei, actuei e dei conferências, é terreno fértil de aprendizagem para mim. Não só se trata do país onde o nível técnico da Dança Oriental está mais desenvolvido como é o sítio onde vejo maior variedade de estilos, maior vontade de FAZER DIFERENTE e com EXCELÊNCIA e onde - aparentemente - existe um estilo de dança oriental nacional.
 
Astrakhan e Moscovo foram as minhas 5ª e 6ª viagens, respectivamente, à Rússia. O pessoal da Embaixada russa já me conhece pelo tom de voz...
Uma das funções que me entregam sempre é de presidir na mesa de júri das competições nacionais e jamais, até agora, me tinha apercebido que existia um "estilo de dança oriental russo". Que (interessante) confusão.
 
A questão é que julgo uma bailarina pelos cânones que carrego comigo - altamente influenciados pelo que conheço, a fundo, do estilo Egípcio. Anos de vida e carreira no Egipto deixaram-me o olho clínico que identifica agulhas no meio de palheiros e que, simultaneamente, é implacável quando se trata de ESTAR ou NÃO ESTAR dentro da Linguagem Sagrada da Dança Oriental Egípcia.
 
Tenho a agradecer à Sophie Armoza - também bailarina e jurada - por ter feito o comentário que me pôs a pensar a sério sobre o assunto:
 
-Estas bailarinas (russas) têm o seu próprio estilo de dança oriental.
-Sim, todas as pessoas têm o seu próprio estilo - isso não significa que possamos ignorar o ABC da linguagem da dança egípcia. Existe um contexto técnico, cultural, emocional que deve ser respeitado.
-Mas o que é facto é que sim, elas ignoram por opção consciente. Ignoram porque querem ignorar e não porque não sabem o que é a dança egípcia. Escolhem fazer as coisas "à sua maneira"; criaram uma forma de dança oriental que não se rege pelos fundamentos da dança egípcia que tão bem conheces...é o estilo delas: o estilo russo...
 
Wow! Levou-me tempo até digerir esta informação. Confesso que não estou 100% convencida. Ainda acho que tem de existir um conhecimento e respeito do que é a essência da linguagem da dança oriental egípcia (se é neste âmbito/estilo que estamos a trabalhar).
 
No entanto, houve algo na minha mente que se abriu: admito que há quem prefira a estética visual à estética emocional (um exemplo clássico que separar o "estilo russo" do "estilo egípcio"); admito que exista uma postura semi-ballética, tensa e linear em oposição à postura orgânica, profundamente descontraída (fluída) e redonda; admito que o foco possa estar no exterior em vez de estar no interior de quem dança (mais exemplos da dicotomia: estilo russo Versus estilo egípcio).
 Admito que existem mais sub-mundos e subculturas do que imaginara e que nem todos buscamos o mesmo. Admito.
É esta - talvez - a finalidade das Viagens: abrir-nos mental, emocional e espiritualmente. Todos diferentes, todos iguais.
Grata à Rússia (por tudo!). 
Agradecendo ao público russo pela forma apaixonante e carinhosa como sempre me recebe.

Um dos MUITOS bouquets de flores oferecidos depois do espectáculo em Astrakhan, Rússia.
O meu quarto de hotel parecia um jardim de tão cheio de flores que estava.

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