Cairo, dia 20 de Janeiro, 2010
“Entre a solidão e as avalanches”
Será normal – e sem consequência – que a esmagadora maioria dos artistas vivam, constantemente, entre a mais pura solidão e as avalanches de gente e energias divergentes?
Tenho reparado que, no meu caso particular como no de tantos outros que conheço (músicos, bailarinos/coreógrafos, cantores, pintores, escritores, etc), existe um estilo de vida – “estranha forma de vida” segundo as palavras da nossa querida Amália Rodrigues – irregular que também deverá contribuir para a ideia generalizada de que os ARTISTAS são gente marginal, fora dos padrões “normais” de vida e longe das rotinas que montam as peças das vidas de milhões de seres humanos à volta do mundo.
Circulo entre a mais pura solidão (absolutamente necessária para escrever, coreografar, orquestrar e montar espectáculos numa base diária) e as avalanches de gente – público – que vem aos meus espectáculos, seminários, etc.
Oito ou oitenta.
Sinto-me totalmente acompanhada “apenas” com a minha ARTE ou com os públicos que me rodeiam e ambas as situações parecem ser, afinal, tão opostas e desequilibradas.
O processo de criação musical e de dança é, para mim, solitário. Tal como é a escrita e todas as actividades em que preciso de estar em silêncio e sintonizada com aquela força criativa superior que me envia o material que, depois, partilho com o público.
Depois existe esse momento mágico de partilha com tanta gente desconhecida que acaba por a mim se unir através da música, da dança e dos sentimentos que através dela eu comunico. Então aí a solidão é partilhada. Não nos tocamos fisicamente – com excepções variadas quando se trabalha no Cairo! – mas sim na Alma e desse mar de solidão de onde tudo aquilo nasceu surge uma comunhão breve, lembrando-me que o valioso tempo me foge das mãos e que os MOMENTOS são para se viver de forma desgarrada.
Entre a solidão – necessária, urgente para a criação artística individual – e as avalanches. De facto, uma estranha forma de vida...
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