Cairo, dia 14 de Maio, 2009
“Estação de gaz e noite quente de espectáculos – combinação explosiva”
Bem, tentemos falar do assunto com alguma compostura e classe, se possível...por onde começar e como abordar um assunto tão pouco poético como um ataque agudo de flatulância a meio de uma noite glamourosa de espectáculos que duraram das sete da noite até quase às tres da manhã?!
Devo dizer, desde já, e em minha defesa que eu não sofro de problemas intestinais nem de ataques de gases como este que me visitou na pior das circunstâncias... o fascinante mundo dos enlatados, prisioneiros e afins não me é familiar (graças a Deus!) e daí a minha surpresa quando, entre um espectáculo e outro senti que a bomba de Hirsoshima renascera dentro da minha barriga, ameaçando destruir tudo e todos à sua volta. Sem aviso nem historial que o fizesse prever, vi-me com a barriga a rebentar de tanto gaz e eu sem saber que voltas daria à minha vida para evitar envenenar os pobres dos meus músicos – que até são bons homens e pais de família – e a audiência que não sonhava estar a presenciar uma estreia absoluta:
“Joana, a gaseificada!”
Terá sido sabotagem de alguma bailarina que pagou ao meu assistente para me “temperar” o chá com leite com algo que me desse a volta à barriga?! Hmmmm...tudo é possível.
Ao abrigo do meu camarim e enquanto mudava, uma vez mais, de roupa, os ataques passaram a ser tão constantes que eu pensei em sugerir ao técnico de som que vestisse um dos meus trajes, rapasse o bigode e se lançasse ao palco no meu lugar. O desespero atiça a imaginação e a necessidade é filha do engenho, de facto...
Aos ataques consecutivos de gases veio juntar-se uma diarreia bárbara que, com muita respiração yogica e pensamento positivo, se conseguiu manter sob controle durante toda a noite. A fome juntara-se à vontade de comer e eu ali, sem saber se aquele era um castigo divino ou a oportunidade de saber, em primeira pessoa, como se evacua um cruzeiro em plena navegação pelo Nilo. O poder dos gases portugueses poderia ter sido testado mas, ainda assim, preferi remeter essa fantástica experiência de uma vida para outra altura. “Save the best for last...”J
E lá me deparei, uma vez mais, com a contradição constante daquilo que a audiência vê e daquilo que eu sinto, por trás da maquilhagem, trajes, luzes e orquestra. Muitas vezes, a audiência vê sorrisos e dança que classifica como “fantástica” e eu choro por dentro (com ou sem gases). O espectáculo tem de ser feito a 100%, independentemente da minha disposição, estado emocional ou físico, inspiração ou até nível de gases no organismo. Diarreias e todo o tipo de ataques intestinais são brincadeiras de meninos e um profissional que se preza não se deixa abalar por tais contratempos! Não penso que tenha de actuar e fingir que está tudo bem, como uma actriz interpretando um papel agradável, mas tenho de conseguir transcender a dor e, neste caso, os gases e a diarreia sua companheira para evitar mortes de inocentes e um novo tipo de espectáculo que eu não me orgulharia de apresentar.
Cada vez que entrava em palco, imaginava uma casa de banho reluzente na minha frente e rolos de papel higiénico em vez de pessoas a aplaudirem...foi grave a este ponto! E, no entanto, sobrevivi e deixei que os demais também assim o fizessem, recordando espectáculos que o público terá descrito como “maravilhosos e cheios de gaz”! Nem eles sonham do que se salvaram...
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