Diz que disse à moda egípcia.
O Egipto continua nas boas do mundo de forma sensacionalista, ao bom estilo da imprensa mundial.
O período pós-revolucionário comprovou aquilo que sempre me pareceu a mim: que, dada a oportunidade de existirem eleições democráticas e honestas neste país, a maioria dos egípcios dariam a vitória à Irmandade Muçulmana.
Chamaram-me pessimista, Velho do Restelo de cabelos aloirados e outros mimos a que já estou habituada. Isto de uma Mulher ter uma VOZ activa ainda incomoda muita gente.
O que previa veio a confirmar-se, para desgosto meu e de muitos que olham a Irmandade Muçulmana com justificada desconfiança e até terror.
A verdade é que o povo teve o direito que merecia a votar mas a verdade é também que um povo sem educação académica e/cívica não está preparado para a Liberdade ou para a Democracia. Estas requerem cultura, cérebros que funcionam, pessoas educadas que sabem distinguir religião de política, campanhas eleitorais de compra de votos, sermões religiosos de lavagens cerebrais. Ora o Egipto, com o tanto que o amo porque é aqui que trabalho e vivo como qualquer outro egípcio, é um país com uma esmagadora percentagem de iletrados (pessoas que não sabem, sequer, ler e escrever). Para as massas deste país, a educação que recebem chega das mesquitas e dos sermões que os "cheiques" lá lhes dão, passando mensagens de extremismo religioso, ódio ao Ocidente e prometendo que o Paraíso na Terra só se consegue com um Governo Islâmico.
Irónico mas verdadeiro: se a maioria do povo egípcio escolhe a Irmandade Muçulmana para governar este país, então a IRMANDADE MUÇULMANA tem o direito de fazê-lo porque foi democraticamente eleita pela maioria.
Agora surgem vozes que se opoem a esta aparente consumada vitória e tantas outras vozes que se juntam ao caos, com ou sem razão para fazê-lo.
Cá por mim, não sou a favor nem contra ninguém mas sou, sem dúvida, em prol do uso do cérebro para mais do que abrir latas de atum. Se houve algo que a nossa história mundial nos ensinou é que a mistura entre Religião e Política nunca traz coisa boa. Quando este cocktail explosivo se dá, existem as Inquisições, as manipulações mentais, vários tipos de fascismos e outros demónios que tais. Aprender com a História é para quem teve essas coisas tão temidas por todos os poderosos financeiros do mundo: educação, cultura.
Entretanto, não se fala noutra coisa: mulheres com mamocas interessantes que passam na rua pedindo para ser assediadas (o Egipto não mudou assim tanto!) e política.
Deita-se fogo a importantes arquivos arqueológicos no centro do Cairo, anda-se à batatada com e sem razão aparente e fala-se mal dos militares que estão, por assim dizer, encostados à parede entre a protecção do seu povo e a tentativa, praticamente impossível, de reestabelecer a ordem para que a vida "normal" possa ser retomada num país já devastado pelos efeitos da queda brutal no turismo.
Como residentes, sabemos acerca das zonas onde estão concentrados os conflitos (perto de Tahrir e, em geral, pela baixa da cidade) e evitamos enterrarmo-nos nesta espiral de auto-destruíção que parece ter-se apoderado do meu querido Egipto.
Sim, o POVO egípcio queria e merecia a Revolução (tal como eu a queria e merecia) mas isso não significa que não hajam muitos outros PODERES (maioritariamente, escondidos) que são CONTRA-REVOLUÇÃO.
Vejo este povo meio perdido, como sempre esteve, porque nunca lhe foi dada a oportunidade de educar-se e pensar por si próprio.
Muito coração e pouca cabeça. Assim foi e assim continua a ser.
Fala-se também do aumento da criminalidade nas ruas do Cairo, algo inédito para mim, e nas Mulheres egípcias que começam FAZER-SE OUVIR num âmbito que não se restringe à Revolução.
Cá para mim, resta o orgulho nesta gente corajosa que chegou a um ponto de miséria e desesperança que disse para si mesma: não temos nada a perder e TUDO a ganhar.
Resta saber que será este TUDO e resta esperar-desejar-lutar para que este TUDO seja o que os revolucionários imaginaram para o seu país e não uma viagem à época medieval que separará, ainda mais, o Egipto da sua própria identidade e grandeza.
O meu coração e a minha mente estão sempre com o Egipto, assim como o meu corpo presente, a minha esperança ou até mesmo a minha ingenuidade, algo que tenho em comum com os meus conterrâneos outrora faraónicos.
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